segunda-feira, 20 de maio de 2013

Ir de carro para o trabalho engorda

Diz o estudo.

Isto para quem precisa de um estudo para demonstrar o óbvio.

Já as crianças, seguem pelo mesmo caminho. Não haja dúvidas que uma das causas é o excessivo sedentarismo. Um normal dia meu de infância esgotaria muitas das crianças de hoje numa hora: futebol, apanhada, bicicleta, três pauzinhos, etc, ao longo de todo um dia. Também tive computador com os jogos, mas veio mais tarde. Hoje, sai-se da escola directamente para casa, onde há videojogos e televisão.

Pergunto: Porque é que não há crianças a brincar na rua ao final do dia? Eu sei que elas estão nas casas, mas porque não saem? O que vejo de diferente com o meu tempo é que as ruas foram tornadas impraticáveis pela ocupação e velocidade do automóvel. As crianças não saem porque "é perigoso". Que espécie de crianças estamos a educar, quando não permitimos que criem laços com os locais e pessoas onde habitam?

Hoje as crianças saem de casa, quando saem, para irem a pequenos parques onde podem brincar e socializar-se. Isso já não acontece no espaço da rua. E para lá chegar, vão de carro. Não se cria o hábito de usar a rua para nela conviver com a vizinhança. Quem é que convive com meio metro de passeio disponível?

Impressiona-me que veja os habitantes dos bairros poucos interessados na a qualidade do espaço que têm à porta de casa, sendo antes a grande preocupação o espaço para estacionar. Mesmo que esse espaço signifique invadir passeios e passadeiras. São os próprios moradores os primeiros a transgredir, pois o automóvel transformou-se numa ferramenta sem a qual não é possível viver, aparentemente. E Deus os livre de andarem 300 metros até ao carro, para o deixarem em sítio adequado.

Cena habitual a qualquer dia ou hora na Estrada de Benfica

Este ciclo é vicioso e pernicioso. É preciso recuperar a liberdade, o bem-estar físico, o espaço da cidade, o silêncio e a convivência. E a bicicleta vai ter um papel preponderante, não haja dúvidas. Lentamente, é o que já está a acontecer um pouco por todo o mundo. Resta saber se queremos ser dos primeiros ou dos últimos a chegar.



quarta-feira, 8 de maio de 2013

Não foi em Marte, mas na 24 de Julho

Uma crónica do outro planeta, chamado Portugal:

Na passada sexta-feira, eram oito e meia da noite e pedalava eu na Av. 24 de Julho, a chegar a Santos vindo de Alcântara e rumo ao Campo das Cebolas, quando oiço uma buzinadela atrás de mim. Pensei trata-se de algum amigo que me tivesse reconhecido (sim, os meus amigos adoram fazer barulho), mas ao olhar para trás vi que era uma rapariga desconhecida na casa dos vinte e poucos anos a conduzir atrás de mim. Pensei que não seria comigo e continuei o meu caminho, apenas para voltar a ouvir a buzinadela insistente. Olhei novamente para trás e reparei que a rapariga esbracejava apontando para mim. Teria um pneu furado? A luz traseira tinha-se fundido? As minhas calças estavam perigosamente descaídas? Um mistério.

Felizmente, naquele momento e após ser ultrapassado pela rapariga, caiu o sinal vermelho e tive oportunidade de esclarecer a interrogação que tinha. Parei ao lado da janela do carro da rapariga e questionei qual seria o problema. Afinal era simples: Eu ia à frente dela, na estrada. Ela queria andar e eu estava ali. Entendia a rapariga que não tinha que andar a "cinquenta à hora".

Passando por cima da sugestão de que eu seguia a 50km/h numa estrada plana (seriam uns 30km/h na melhor das hipóteses), ainda questionei onde é que ela pretendia que eu andasse e se acaso uma bicicleta estava impedida de andar na estrada. Esclareceu que sabia que eu podia andar na estrada, mas ainda assim ela queria passar e eu, "estava ali". Estava visivelmente inconformada com a situação.

Esclareça-se que "ali", era na metade direita da faixa direita de uma avenida com duas faixas de rodagem e o trânsito era mínimo. Havia carros estacionados ainda mais à direita, pelo que deles guardava a habitual distância de 1,5m (prevenindo embates por abertura de portas dos carros estacionados).

De referir ainda que se parecia à rapariga que ia a 50km/h, então estava a protestar de ir no limite da velocidade legal dentro da cidade. Infelizmente, no calor da situação e porque surgiu uma ambulância em emergência, tivemos que abrir caminho e não acabámos este profícuo diálogo, mas o que sucedeu foi suficiente para me impressionar.

A rapariga protestou buzinando, porque queria andar mais depressa e uma bicicleta impediu-a de acelerar naquele momento, naquela via. Ela tinha esse direito e eu o dever de lhe sair da frente. Parece óbvio.

A verdade é que o limite de velocidade na Av. 24 de Julho não tem qualquer significado. O seu cumprimento é mais a excepção do que a regra. Na maioria das vezes é a velocidade mínima a que todos circulam. Numa via de duas ou três faixas com os peões distantes e separador central, seria preciso um controlo policial permanente para impedir as pessoas de acelerar. Mas não me recordo de um único controlo do género nos últimos 10 anos. Ninguém quer saber do controlo de velocidade em muitas vias da cidade de Lisboa, onde cada um acelera a seu bel-prazer e quando há acidentes, logo se vê.

No entanto é das zonas de Lisboa mais amiga para andar de bicicleta, por ser totalmente plana, ter sempre mais do que uma faixa, permitindo ultrapassagens fáceis pelos automóveis e correr Lisboa de lés a lés. Provavelmente a rapariga achou que eu estava a passear, dificultando o trânsito de forma gratuita, mesmo estando eu com roupa normal (não desportiva) e numa bicicleta de cidade.

Assim se demonstra que acima dos problemas de declives, calor ou chuva, a maior dificuldade está na mentalidade de muitas pessoas, que ainda vêem a bicicleta como uma ferramenta de lazer e não um meio de transporte válido, legítimo e acima de tudo desejável.